Amiga, você continua linda e, para alguém que não a conheça, é impossível adivinhar a quantidade de remédios que toma. Como é uma mulher bem resolvida, e com a mente equilibrada, só pode ser uma piada do destino pra destituir o axioma “mens sana in corpore sano”.
Sendo assim, apesar de João Cabral, prefiro uma cerveja ao sol da aspirina.
Sei que, no fundo, tudo é uma questão de escolher a multinacional: eu, com a AMBEV; você, com a Pfizer, a Merck Sharp Dohme e tantas outras. O importante nesta comédia humana é que somos, apesar de alguns acharem que não, felizes, na medida do possível, do copo e do comprimido. E também da centena de arte-terapias ocupacionais desenvolvidas para preencher o intervalo entre um copo e um comprimido.
Além disso, parafraseando o Nelson Rodrigues, toda a totalidade é burra, inclusive a festiva.
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Lembro com uma gostosa nostalgia que a sua felicidade não conseguia entender o meu assombro em relação à plenitude da sua satisfação com o “estar no mundo” e, assim, nossas discussões mais pareciam conversas de doido, cada um seguindo para um lado e tentando manter as mãos dadas. Não falo de alienação. Falo de intoxicação mínima, ou, controlada.
Wood Allen teria nos adorado.
Também na questão gosto musical e programa para se divertir é impossível encontrar dois seres mais díspares na face da terra: você, energizada pelo batuque do Monobloco, e eu, achando que ele deveria sustentar os descendentes do Tim Maia, inclusive os que ainda chegarão a este planeta. Você se acabando na techno e eu achando que houve algum problema com o equipamento. Você aplaudindo a Zélia Duncan e eu querendo que ela parasse de regravar a Legião Urbana.
Não estou dizendo com isto que não reconhecesse valor, ou não gostasse e tivesse em sua coleção a ‘boa música’, mas, para se divertir era necessário se desligar. Quanto a mim, justamente o contrário.
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E a expectativa de vida? Caramba!!! Outra coisa que não se resolvia jamais. Enquanto você observava a ciência na expectativa de chegar aos 200 anos, eu já ia dizendo adeus e considerava viver demais um desrespeito, além de quê, ficar velho é o troço mais antigo que já se viu.
É bem provável que esta minha atitude tenha influências nas minhas tendências, digamos, um tanto anárquicas, de não querer, no final da vida, me associar à indústria farmacêutica, nem abarrotar minha agenda com telefones de médicos, por sinal, nestas ocasiões, amigos íntimos – até demais – com seus diversos exames e ‘toques’.
Enquanto você pensava na festa, no cosmopolitismo de uma alimentação balanceada, eu pensava numa ilha e num peixe frito acompanhado do mar. E o mar que para você era os trinta minutos do pôr-do-sol, para mim, era o aconchego permanente, lugar da melhor música, do melhor lazer, da melhor festa, do maior espetáculo.
E, claro, nunca bati palmas para o pôr-do-sol – rs.
Enquanto você estudava a coleção primavera-verão e comprava as revistas das últimas tendências de uns seiláquantosestilistasquetodomundoconhece, eu escolhia qual a camisa azul clara, bege, e qual o tênis mais discreto que poderia colocar.
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Bem, agora que estamos tão distantes (?), fico com um riso satisfeito no rosto, um riso feito por esta bela saudade e a satisfação de termos discordado em tantas coisas desimportantes e rido de todas elas – a única concordância fundamental.
Um grande beijo.
Máximo
Com tantos opostos, que tal se casarem?
ReplyDeletePS: Só não pode tomar a cerveja junto com o comprimido!
Braços!
é verdade, é verdade. rs
ReplyDeleteabraço.
Gostei. Leia no meu blogue a fantasiosa história familiar do narrador alien.
ReplyDeleteMariel
Viver as diferenças - deste remédio que precisamos!
ReplyDeletese eu não fosse casado, diria "viva as diferenças". sabe aquela garota estranha que parece sentir prazer em discordar de você o tempo todo e você pensa "puta merda, que tesão isso me dá"? não dá pra pedi-la em casamento.
ReplyDeleteé por aí, meu nobre Marlon. é por aí... mas, a vida tem seus "dezcaminhos" (rs - desculpe, não resisti) e a gente sempre escolhe o... o... o caminho (borgianamente falando). rs
ReplyDeleteabraço.
Achei linda sua carta! Sabe, do tipo de una meiguice talvez, ou serenidade, e uma transparência. um aconchego gigante. Me inspirou aqui (:
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