4.10.25

Brasília, Setembro de 2025

 

Alguns dos meus tios chegaram à capital do país no começo de tudo, trabalharam e criaram suas famílias dentro da estrutura burocrática que sustenta o poder central. Meu padrinho, Paulo Lustosa, irmão de meu pai, foi deputado federal e ministro do governo João Batista Figueiredo,  adotou Brasília. Minha prima Andrea, filha do Elcías, declara, sem corar, que não conseguiria viver numa outra cidade – dada a organização e a segurança que sempre estiveram presentes na sua vida. É possível... Morador do Rio de Janeiro desde os meus distantes sete anos, bem sei o que éramos, nunca o paraíso, e o que nos tornamos, bem perto do caos que, de alguma forma, começamos a exportar para o resto do país.

Enfim, volto, acho que pela quarta vez, a Brasília, agora, para encontrar a família e comemorar o aniversário da tia Villany, mãe do André – e reencontrar um pouco de mim mesmo, no encontro com primos e primas que estiveram presentes nas festas no Ceará. Festejamos novamente uma comunidade que aproxima generosamente e permite o fortalecimento de nossa ancestralidade Dona Dolores e Seu Lustosa – pois, como ensinou Ailton Krenak: “o futuro é ancestral”. O encontro foi um primor, meu primo, meus primos.

Aproveito a oportunidade para reconhecer o cenário que tem frequentado o noticiário e os documentários de Petra Costa – e fecha a última cena de “Tropa de elite 2: o inimigo agora é outro”. 

É dia 28 de setembro e, num céu azul retinto, há um sol para cada um – como estou relendo o “Grande sertão”, lembro o Liso do Sussuarão. Uma corrida com a presença das estrelas do governo federal, incluindo o presidente Lula, Fernando Haddad e Camilo Santana, respectivamente o ministro da fazendo e o da educação, comemora os 95 anos do Ministério da Educação. É um evento fechado, mesmo quando as autoridades principais não estão mais lá. De fora, ouço a banda cantar “Tempo perdido”, da banda brasiliense Legião Urbana, que embalou a minha juventude. (Livre para pensar bobagens, sem a pretensão de invadir quartéis, ou começar revoluções, lembro que, em Minas Gerais, ouvi muito J Quest, Skank, Milton Nascimento.)


Não consigo decidir se Brasília é bonita - como uma sereia no meio do Planalto Central. Talvez, o adjetivo correto seja: funcional. E, por aí, me parece uma mensagem clara dos que planejaram a cidade colocar uma biblioteca antes da igreja e dos ministérios. Por outro lado, em mim, considerando o atraso que reconheço na educação nacional, pública ou privada, sinto que nem os 95 anos nem a biblioteca foram bem aproveitados, haja vista a seleção que o povo faz dos seus representantes.

Em frente à catedral, o vendedor tem broches com as bandeiras de Brasil e Israel, Brasil e Argentina, e do ex-presidente. Quando pergunto se tem do Uruguai, ele diz que não, mas que tem dos Estados Unidos. Agradeço, mas recuso. Compro a do Brasil com a Argentina, na esperança que Milei desapareça e, assim como a bandeira do Brasil, eu não me sinta mais constrangido com as escolhas dos Hermanos.

Caminho de volta até a Torre, onde uma feira de artesanato reúne turista para almoçar e dançar charme com um dançarino do Rio de Janeiro. Sempre me espanta ver que os roqueiros, e suas tatuagens destruídas, envelheceram, mas ver os charmeiros também envelhecidos, e ainda fazendo seus passinhos, me causa uma sensação semelhante a olhar para Brasília, a saber que o Ministério da Educação tem 95 anos. É como se eu percebesse que ficamos pelo caminho e, portanto, estamos fazendo o que é possível. Não temos sonhos maiores. Como se nunca tivessem planejado o futuro do país do futuro.

Volto meio entristecido para o Airbnb onde aluguei um apart. Vou pegar a mochila e voltar ao medo de viver no Rio – que, este sim, é bonito.

***


Da centena de fotos que tirei, apenas duas ou três me agradam: a foto de uma sereia, perdida no planalto central, e uma mangueira – aliás, a cidade está cheia de mangueiras carregadas. Gostei também das 60 palmeiras que persistem tentando amenizar o concreto e o vazio, engoli-los.


José, o motorista que nos leva ao sítio do encontro da família, fala dos belos Ipês amarelos, roxos e brancos que, aqui e ali, vão falando de outras coisas "infuncionais" e belíssimas.

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